<em>Telepregador</em> apela ao assassínio de Chávez

Pedro Campos
«... Eu não sei sobre essa doutrina do assassinato, mas se (Chávez) pensa que estamos tratando de o matar, acho que deveríamos avançar e fazê-lo. É muito mais barato do que começar uma guerra (...) Temos capacidade para tirá-lo e... chegou o momento de que exercitemos essa capacidade (...) Não precisamos de outra guerra de 200 mil milhões para nos livrarmos de um... ditador severo. É mais fácil fazer que alguns agentes secretos façam o trabalho e terminar com isso de uma vez.»
Estas declarações de Pat Robertson convidando ao magnicídio do presidente bolivariano foram ditas no programa The 700 Club, da Rede de Difusão Cristã, que transmite o canal estado-unidense CBN, que chega a 200 países e é escutado em 70 idiomas. Deram a volta ao mundo em poucas horas e foram escutadas e lidas por milhões de pessoas de forma quase instantânea.
Quem é Pat Robertson? Um telepregador da extrema-direita dos Estados Unidos, ex-candidato presidencial republicano, amigo íntimo de George W. Bus e dono de uma fortuna que supera amplamente os 200 milhões de dólares e poderia aproximar-se dos
mil milhões, segundo o livro The Best Democracy Money Can Buy (2002), de Greg Palast. É racista declarado e em relação ao princípio de «um homem, um voto» diz que não é razoável. Sobre a igualdade dos sexos, afirma: «Sei que isto é doloroso para as mulheres, mas se se casam, devem aceitar a liderança do homem. Cristo é o chefe da casa e o marido o chefe da mulher; é assim e mais nada». Mais: «os ateus não devem ser considerados cidadãos, nem patriotas. Esta é uma nação sob Deus». E em termos de educação, além de ser antidarwinista, acha que quando pública «é um movimento anticristão».

Mundo reage estupefacto...

Como não poderia deixar de ser, as declarações de Robertson foram imediatamente repudiadas por vários outros líderes religiosos, políticos e média dos Estados Unidos. Em contraste, Washington – talvez por temer o poder político do telepregador ou por não discordar do dito – limitou-se a afirmar que era uma declaração pessoal «imprópria». Escândalo!
O Washington Post criticou o silêncio da Casa Branca e dos grupos conservadores. Do mesmo modo opinou o New York Times, que exigiu maior severidade do governo na condenação destas declarações. «A decência comum, para não mencionar um sentido racional do interesse nacional, exige (a Bush) uma condenação das declarações», escreveu, ao lembrar que o apoio de Pat Robertson foi crucial para Bush. A revista Time afinou pelo mesmo discurso. Nancy Pelosi, do partido Democrata, convidou o hóspede da Casa Branca a pronunciar-se no sentido de «responder com força às palavras de Robertson para deixar claro que as nossas leis proíbem o assassínio». Outros líderes religiosos, entre eles Rob Schenk, presidente do Conselho Nacional do Clero; Richard Cizik, da Associação Nacional de Evangélicos, e Graylan Scott, questionaram os comentários de Robertson. O último foi mais longe e afirmou que o telepregador «não é
cristão; ele e os seus aliados utilizam a religião para fins políticos. Por outro lado, Ted Haggard, presidente da Associação Nacional de Evangélicos, está no México para tratar de conseguir uma reunião pessoal com Hugo Chávez, com a finalidade de apresentar pessoalmente as suas desculpas.
Um dia depois da sua apologia do crime e da onda de repúdio universal, Pat Robertson quis dar o dito por não dito mas a emenda foi pior do que o soneto. «É correcto apelar ao assassínio? – perguntou-se – Não! E ofereço desculpas pela declaração.» E depois esclareceu que «tirá-lo» (a Hugo Chávez) pode ser muitas coisas, incluindo «sequestrá-lo». É evidente que esta não é uma declaração estúpida, mas o reflexo de uma política de Estado, que já foi aplicada várias vezes em todo o mundo. Ao nível da América Latina está ainda fresco de sangue o sequestro de Aristide, no Haiti, e o que se está a passar no Iraque é um livro aberto onde se pode ler claramente a política de Washington para o mundo.
Entretanto, é evidente que existe outro rosto dos Estados Unidos. O reverendo Jesse Jackson, para quem «o modelo político da Venezuela é um exemplo para todos os países do mundo» prova-o. O final da sua visita de três dias à capital venezuelana coincidirá com o 30.º aniversário da famosa marcha de Martín Luther King e do seu I have a dream, que recordará no parlamento de Caracas. «Fala-se muito sobre o direito ao voto democrático – lembrou – mas também deveríamos ter direito a uma boa vida, à saúde e à justa distribuição dos recursos. É um dia novo e é hora de levantar os de menores recursos».
Se é certo que Pat Robertson mereceu comentários editoriais de jornais como o New York Times, o mesmo não parece ter-se passado em Caracas. A oposição guarda um silêncio estranho, talvez porque está ocupada a esfregar as mãos de contente. Mais que assunto do foro psiquiátrico, parece sê-lo do ético.


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